top of page
Buscar

INFIDELIDADE CONJUGAL GERA DANO MORAL?

  • Foto do escritor: Ronaldo Domenicali
    Ronaldo Domenicali
  • 14 de mar. de 2023
  • 4 min de leitura

No princípio viu Deus que não era bom que o homem estivesse só e fez uma adjutora, determinando a união e multiplicação desta família, conforme se prevê no início do livro de Genesis, Bíblia Sagrada.


Dentro da criação, Deus deixou o sentimento amor prescrito como mandamento, estando expresso pelo apostolo João, que aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus se define como amor, Primeira João capítulo 4, versículos 7-8 das Escrituras Sagradas.


ree

Com toda essa ordenança e diante da evolução humana, o Estado, em especial o brasileiro, no artigo 226 da Constituição Federal assegurou a proteção especial a família, por ser esta a base da sociedade.


Por intermédio do Código Civil houve regulamentação das relações de família, bem como sobre casamento, regimes de bens, deveres conjugais e sucessões.


O Código Civil, em seu artigo 186 prevê que aquele que causa danos a outrem, ainda que moral, pratica ato ilícito, devendo repará-los, nos termos do artigo 927 do mesmo ordenamento jurídico.


A fidelidade conjugal é dever de ambos os cônjuges, conforme preceitua o artigo 1566, inciso I do Código Civil. Contudo, não é crime, visto que o adultério tipificado no artigo 240 do Código Penal foi revogado com o advento da lei 11.106/2005.


Vale ressaltar que inicialmente, ao analisarmos o Código Penal de 1830 extraímos do artigo 250 que o adultério só poderia ser cometido pela mulher. Tratava-se uma tentativa de proteção ao homem, cujo poder detinha na relação familiar.


Entretanto, sempre foi letra morta, pois era de difícil aplicação, uma vez que caia no desprezo da sociedade, bem como era ridicularizado o homem que tentasse punir a mulher com a pena de adultério.


A sociedade, evoluiu e, ao longo do tempo, os direitos entre homens e mulheres vem se equiparando, de forma que diversas demandas foram ajuizadas por ambos visando reparação de dano moral por violação a fidelidade conjugal.


Oportuno destacar, conforme ensina Yussef Said Cahali, em sua obra Dano Moral, o dano moral é “tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes a sua personalidade ou reconhecido pela sociedade em que está integrado”.


Significa dizer que uma vez dilacerado os bens inerentes a vida ou sua diminuição, afetando a paz, a honra, a reputação entre outros afetos estaremos diante do dano moral.


Contudo, em especial a simples quebra da fidelidade conjugal, não tem gerado o dever de reparação por dano moral. Significa que o mero dissabor experimentado pelo cônjuge, não se traduz em dano moral sendo necessário que produza sofrimento físico, exposição pública, humilhação e constrangimentos.


Conforme voto do Desembargador Fernando Reverendo Vidal Akaouni, na apelação cível 1046379-92.2018.8.26.0602 do TJSP “os danos morais seriam cabíveis em hipótese de efetiva ofensa e não de descumprimento do dever conjugal que, nos dias atuais, são entendidos como algo inerente a aspectos morais e também modo de viver de cada unidade familiar”. (G.N)


Portanto, pode se afirmar que para haver reparação ao dano moral é preciso que seja base de reparação a ofensa causada. Isto é, em tese se não tiver a intenção de humilhar ou dilacerar a honra, a infidelidade por si só não gera danos morais.


Melhor sorte não há nos casos em que resta comprovado a violação à dignidade humana decorrentes dos atos ilícitos tais como agressões físicas, ofensa a liberdade, injúria grave, tentativa de homicídio entre outros atentados contra a pessoa humana.


A 6ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação 272.221-1/2, 10.10.1996, considerou haver dano moral nos casos em que há simulação do estado de gravidez, pois esta atitude “provocou um agravo moral que requer reparação, com perturbação nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos sentimentos e nos afetos”.


Outro ato ilícito capaz de gerar dano moral se dá quando o esposo espanca a mulher, ao ponto de acarretar lesões físicas e neuropsíquica, isto ocorre porque o próprio ato de lesionar causa intenso abalo moral. Ademais, a agressão também gera desestruturação familiar.


Pode se dizer também que induzir a erro a paternidade causa dano moral, conforme já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 922.462 -SP, Ministro Relator Ricardo Villas Boas Cueva:


O cônjuge que deliberadamente omite a verdadeira paternidade biológica do filho gerado na constância do casamento viola o dever de boa-fé, ferindo a dignidade do companheiro (honra subjetiva) induzido a erro acerca de relevantíssimo aspecto da vida que é o exercício da paternidade, verdadeiro projeto de vida.


Por fim, o amor e a felicidade não é objeto de imposição legal, decorrendo de mandamento religioso. Além do mais não há como atribuir a pessoa humana o dever de amar ou manter-se no relacionamento. Motivo pelo qual, o simples ato de separar não gera nexo de causalidade capaz de sobrepesar reparação de dano.


Entretanto, mesmo com a evolução social, não podemos simplesmente fechar os olhos ao dever de fidelidade, pois, em sendo demonstrado efetivamente o abalo emocional, decorrente de ato ilícito, poderá estar caracterizado o efetivo dano capaz de justificar a reparação.


Outra possibilidade de se respaldar em eventual reparação de danos, decorre do direito preventivo, isto é, de cláusulas pré-constituídas em pacto antenupciais, visto que ao nosso entender poderá o casal estipular as regras do compromisso de fidelidade sob pena de sanção pecuniária.


Tal prática vem ganhando força, tendo em vista a autonomia de vontade do casal e a garantia do livre planejamento familiar. Neste sentido, enunciado 635 da VIII Jornada de Direito Civil que prevendo que “o pacto antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar”.


Por Ronaldo Domenicali

 
 
 

Comentários


© 2023 Ronaldo Domenicali Advogado

bottom of page